JESUS O AMOU
O evangelista Marcos deixou registrado, em seu evangelho, o episódio em
que um homem se aproximou de Jesus e lhe fez a seguinte pergunta: “Bom mestre,
que farei para herdar a vida eterna?” (Marcos 10:17-31). Essa narrativa, embora
breve, é rica em termos teológicos. Ela contém desdobramentos relativos à
condição humana (Antropologia Teológica), à natureza divina (Teologia) e
aspectos relacionados à salvação do homem (Soteriologia). Mas, chama a atenção,
no texto, o fato de, antes de dar sua resposta definitiva à questão levantada,
“Jesus olhou para ele e o amou” (10:21).
Jesus o amou, certamente, pelo fato de estar diante de um homem,
meramente, religioso. O Senhor disse: “você conhece os mandamentos: ‘não
matarás, não adulterarás...”. Então o homem declarou: “Mestre, a tudo isso
tenho obedecido desde a minha adolescência”. A indagação daquele homem revela
que o tentar cumprir os mandamentos divinos não traz a certeza da salvação,
mesmo porque ninguém consegue cumprir toda a Lei. Se cair em algum mandamento,
torna-se réu de culpa. Aquele homem, mesmo sendo religioso, não se sentia
salvo. Não sabia de seu destino após a sua morte.
A religião não salva o pecador. A religião é uma produção humana fruto
da consciência separada de Deus. Ela apenas expressa o desejo e o anseio da
criatura de reencontrar-se com o Criador. Sobre buscar a salvação da alma pelo
cumprir a Lei, Paulo falou que os judeus eram zelosos por Deus, “mas ignoraram
a justiça que vem de Deus e procurando estabelecer a sua própria, não se
submeteram à justiça que vem de Deus. Porque o fim da Lei é Cristo, para a
justificação de todo o que crer” (Romanos 10:1-4). Isto é, só em Cristo o homem
cumpre a Lei de Deus, pois Ele foi o único homem que a cumpriu plenamente. Os
religiosos da época de Cristo, no entanto, o mataram. Eles confiavam mais em
seu sistema religioso que no próprio Deus.
Jesus o amou, provavelmente, porque estava diante de alguém que pensa
que pode controlar todas as coisas. Foi o desejo de autonomia, o de desejo de
estar no controle de sua própria existência que levou o homem à Queda, à
separação de Deus. Ele pergunta: “...que farei para herdar a vida eterna?”. Ele
queria fazer algo para alcançar a salvação. Ao realizar algo, ele se vê no
controle dessa questão. É como se a salvação não dependesse só de Deus, mas do
homem também.
O ser humano, por causa do pecado original, já nasce separado de Deus,
isto é, morto espiritualmente. E morto não reage, não apresenta reação alguma
quanto à realidade espiritual. Por isso Paulo disse, escrevendo aos Efésios:
“vocês estavam mortos em suas transgressões e pecados, nos quais costumavam
viver, quando seguiam a presente ordem deste mundo... Todavia, Deus, que é rico
em misericórdia, pelo grande amor com que nos amou, deu-nos vida com Cristo,
quando ainda estávamos mortos em transgressões – pela graça vocês são salvos”
(Efésios 2:1-5).
Isso significa que a salvação é um dom de Deus, é um presente divino ao
homem que, por seus próprios esforços, é incapaz de alcançá-la. Deus disse a
Moisés: “terei misericórdia de quem eu quiser ter misericórdia e terei
compaixão de quem eu quiser ter compaixão” (Êxodo 33:19; Romanos 9:15). A
salvação humana é algo que depende, exclusivamente, de Deus e não há nada que
possamos fazer para alcançá-la, pois até mesmo “...os nossos atos de justiça
são como trapo imundo... (Isaías 64:6). Por essa razão Paulo escreve: “vocês
são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus;
não por obras, para que ninguém se glorie” (Efésios 2:8,9).
Jesus o amou porque estava diante de um homem que, possivelmente, não
alcançaria a salvação. Era um religioso, mas estava preso às amarras da
idolatria. Jesus disse para ele: “falta-lhe uma coisa... Vá venda tudo o que
você possui e dê o dinheiro aos pobres...”. O texto diz que “ele ficou abatido
e afastou-se triste, porque tinha muitas riquezas”. Não há nenhum problema com
as riquezas, mas se depositamos nossa confiança nelas, elas se tornam um ídolo
e tomam o lugar de Deus em nossa vida. É preciso se desprender das amarras do
mundo para poder caminhar em direção a Deus. Essas amarras podem ser muitas
coisas: status social, bens, fama, poder, religiosidade morta, orgulho,
arrogância, pecados vis... Sobre isso Pedro disse: “nós deixamos tudo para
seguir-te”.
Por fim, na narrativa, Jesus fala da dificuldade de o homem alcançar a
salvação de sua alma. Ele disse: “filhos, como é difícil entrar no Reino de
Deus! É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico
entrar no Reino de Deus. Os discípulos ficaram perplexos, e perguntaram uns aos
outros: nesse caso quem pode ser salvo?” A perplexidade deles estava no fato
de, naquela época, as riquezas eram símbolos da benevolência divina e garantias
de recompensas celestiais [1]. Era um conceito equivocado, pois Jesus nasceu e
viveu entre os pobres. Mas voltando à questão “quem pode ser salvo?”, Jesus
respondeu: “para o homem é impossível, mas para Deus não...”. Para o homem é
impossível alcançar o Reino de Deus, a não ser que receba ajuda divina. Aqui
cabe lembrar o que Jesus falou a um dos malfeitores que estava sendo
crucificado com Ele: “eu lhe garanto: hoje você estará comigo no paraíso (Lucas
23:43).
[1] Sociedade Bíblica do Brasil. Bíblia da Mulher. Barueri-SP, 2014,
p.1350
Antônio Maia – M.Div.
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