O DEUS ABSCÔNDIDO
Um breve olhar sobre a humanidade e logo se observa que ela se encontra
imersa em um profundo processo de dor, sofrimento e angústia. Há, no mundo,
guerras, rumores de guerras, fome, doenças e catástrofes. Alguém pode
perguntar: “onde está Deus?”. Até mesmo, entre os cristãos, mesmo entre os que
vivem uma vida de devoção, em certos momentos de dor e sofrimento, sentem uma
ausência e um silêncio de Deus. Como entender isso? Estará Ele alheio ao
sofrimento humano?
De fato, o Antigo Testamento trata, com frequência, sobre o ocultamento
de Deus. Smith (2001, p.99) afirma que há trinta e duas referências que falam
que Deus esconde o rosto, os olhos, os ouvidos e que Ele se oculta. O Salmo
10:1, por exemplo, diz: “Senhor, por que estás tão longe? Por que te escondes
em tempos de angústia?”. Já Isaías afirma: “verdadeiramente tu és um Deus que
se esconde, ó Deus e salvador de Israel” (45:15). Esse ocultamento “refere-se
principalmente à sua inatividade em favor de seus adoradores e ao fato de Deus
não responder às orações deles” (SMITH, 2001, p.100).
Realmente, não compreendemos o agir de Deus. Mesmo após sua revelação
aos profetas e por meio do Filho, isto é, Jesus Cristo, Ele permanece um
mistério. Atkinson (2009, p.295) diz que “o Deus revelatus ainda permanece um
Deus velatus. Moisés, Jacó, Jó, os salmistas e os profetas mostram-se, todos,
conscientes do fato de Deus ser “oculto”, mesmo em seu ato de se revelar”. Ele
nunca se mostra em sua real natureza, em sua essência, pois é indiscernível à
mente caída. João, em seu Apocalipse, sobre Ele só conseguiu dizer: “o que está
assentado no trono...”. Deus é indescritível.
De acordo com Jó, Deus está além de nossa compreensão (37:23) e Isaías
fala de nossa incapacidade de compreender os seus pensamentos (55:8,9). Só o
compreendemos a partir de nós mesmos, eis porque se encontra uma linguagem
antropomórfica (a mão, o rosto, os olhos, o ouvido de Deus) na Bíblia. Por essa
razão, Ele se revelou em forma humana, no Filho. Mas mesmo nesse gesto, “Deus
não nos oferece dom menor do que ele mesmo. Essa é a suprema revelação, em que
o Deus oculto é revelado. ‘Quem me vê a mim, vê o Pai’” (ATKINSON, 2009,
p.296).
Ao par disso, com respeito ao sofrimento, no mundo, este é inerente ao
caminho que o homem pegou ao afastar-se de Deus. O projeto do homem caído é um
mundo sem Deus. Em sua loucura ele diz: não há Deus, mas isso tem um preço:
dor, angústia e finitude. Contudo, em momentos de angústia ele se lembra do
Criador, mas só ouve um grande silêncio. Sua própria condição de queda o impede
de ouvi-lo. Mas Ele não deixou a humanidade à mercê de seu destino, antes, em
Cristo, estabeleceu um caminho de volta à sua condição original de
perfeição.
Mas esse ocultamento também se observa entre muitos que se dizem
cristãos que, buscando seus próprios planos, pensam que podem domesticar Deus.
Ele, contudo, “não é prisioneiro de pensamentos humanos ou cativos de seus
esquemas”. No entanto, mesmo entre fiéis piedosos o ocultamento de Deus ocorre,
talvez porque seja preciso que eles trilhem sozinho certos caminhos. Jesus, na
cruz, por exemplo, sentiu esse ocultamento do Pai a ponto de clamar “Meu Deu!
Meu Deus! Por que me abandonaste?” (Mateus27:46).
Embora esse aspecto do Ser de Deus, o seu ocultamento, a Escritura
revela que Ele é sublime e amoroso, e a todos atrai. O que faz, por exemplo, os
anjos permanecerem continuamente, diante dele, em adoração? Ao mesmo tempo em
que Ele é um Deus que se oculta, é um Deus que se revela. Mas o caminho até a
sua presença, à sua percepção passa pelo coração, pelo imaterial, pelo ilógico,
pela fé. Ele falou as seguintes palavras para um profeta que experimentou o seu
ocultamento, em alguns momentos: “clame a mim eu lhe responderei e lhe direi
coisas grandiosas e insondáveis que você não conhece”.
Antônio Maia – M. Div.
Direitos autorais reservados
ATKINSON, J. Novo Dicionário de Teologia. São Paulo: Hagnos, 2009
SMITH, Ralph L. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova,
2001
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